Os blogs estão voltando?

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O ano era 2013, em meio à minha conta do Tumblr e o respirar por aparelhos do meu fake do Orkut, fui apresentada a um site bem diferente de tudo que eu já tinha visto, chamado Blogger. O próprio conceito de bloggar já era familiar, mas usava para me referir ao ato de compartilhar devaneios e besteiras na internet.

Há uma década o conteúdo criado e postado na internet era bem diferente. Inclusive, o próprio nome Nostalgia Cinza se remete a uma época mais simples da internet, em que a melancolia de posts inofensivos se cruzava com a poética de textos que jamais sairiam de um blog post. Porque eles eram destinados a isso mesmo, sem querer vender nada, sem divulgar produto algum, sem monetizar nada, sem intenção ou pretensão de ser mais do que eles deveriam ser: blog posts.

Uma das coisas que eu mais gostava na época em que os blogs explodiram (bem antes de eu começar a postar em um, em 2013) era que o conteúdo escrito ainda era muito mais valorizado do que imagens e vídeos de consumo rápido. Além disso, a gente não precisava mostrar tanto a cara e de formas tão diferentes todos os dias (os introspectivos que tentam ganhar a vida com a internet sofrem).

Sem contar que eu separava uma hora do meu dia e ali no meu feed ficava em dia com os blogs e textos que eu considerava interessantes. Sem pressa. Não faria diferença se eu não pudesse entrar naquele dia porque o conteúdo continuaria ali, intocado, relevante. Em ordem cronológica.

Os blogs, mesmo que feitos e mantidos de forma individual, sempre passaram uma sensação de comunidade e pertencimento singulares. Além disso, eles popularizaram a criação de conteúdo e acessibilidade à criação de sites como nunca.

Mas os tempos mudam e se tem uma coisa que quase uma vida inteira na internet me ensinou é que a gente precisa saber mudar com eles. De repente bloggar era ultrapassado, afinal, por que diabos eu iria ler um post inteiro com algo que posso encontrar, mesmo que de forma mais superficial, em um story de 15 segundos?

A MUDANÇA DOS BLOGS

Desde o boom do entendimento de que o marketing de conteúdo é extremamente eficaz no fortalecimento de uma marca e na conversão de leitores em clientes, os blogs passaram por uma quase revolução. Nunca mais consegui procurar uma informação que não aparecesse entre milhares de posts de empresas com listas de motivos para conhecer tal pessoa que na verdade é dono de tal empresa.

Inclusive, durante algum tempo, eu mesma trabalhei como freelancer, escrevendo sobre os mais diversos assuntos, sem me aprofundar tanto. Hoje, trabalho com conteúdo, mas conteúdo rico e relevante, o que já mostra ainda mais como a produção e o compartilhamento de informação na internet vêm se transformando, como os leitores estão mais exigentes e, claro, como os blogs resistem.

Mas para além desse tipo de conteúdo, meu coração sempre nostálgico (o nome do blog está aí pra provar) vem ficando quentinho por perceber que algumas pessoas parecem estar voltando às origens da blogosfera e têm bloggado por bloggar. Apenas.

UM ODE À NOSTALGIA

A quarentena fez com que reascendesse a chama da nostalgia em muita gente, além de ter disparado ohábito de ler de quem não encostava em um livro há algum tempo. Fomos obrigados a desacelerar. E tenho a sensação de que, em meio a um longo tempo e processo de solidão, as pessoas passaram a sentir falta de um aconchego. E, vamos combinar, já estamos calejados o suficiente para reconhecer que hoje em dia as redes sociais que se alimentam prioritariamente de imagens (incluindo fotos e vídeos) estão se tornando verdadeiras vitrines.

Entrar no Instagram hoje em dia é quase o equivalente a bater perna no shopping. As fotos dos amigos que quero acompanhar e ter por perto já se perderam há muito tempo em meio a posts patrocinados de produtos e marcas das quais não tenho interesse algum em comprar.

A verdade é que estamos cansados de receber apenas aquilo que algum algoritmo acha que queremos receber. Onde foi parar a ordem cronológica? Onde foram parar todas as fotos de pessoas que eu escolhi seguir, mas não vejo no feed?

E, em meio a uma busca por aquilo que antes nos trazia conforto, os blogs vêm voltando a ser pauta e um destino para usuários que querem um pouquuinho mais de quem eles acompanham ou dos assuntos que os interessam.

Dados da Finances Online mostram que, só nos Estados Unidos, blogueiros correspondem a mais que 10% da população e que, por lá, 77% dos usuários da internet visitam e leem blogs todos os dias.

Segundo um relatório da First SiteGuide, a maior parcela de blogueiros tem entre 25 e 34 anos, seguidos daqueles entre 35 e 44. E talvez não seja de se surpreender também, que a principal razão para a criação de um blog seja, de acordo com o relatório, encontrar um escape para se expressar de forma criativa. Inclusive, mais de 90% recomendam começar um blog atualmente.

Ainda nessa pesquisa, 46,50% dos blogueiros entrevistados disseram que estão bloggando mais desde o início da pandemia e o mesmo relatório aponta que os blogs tiveram um aumento de 54,27% de tráfego durante o período.

O QUE FAZEMOS NA INTERNET

Recentemente, também tem se falado cada vez mais sobre slow content como uma resposta justamente a esse imediatismo das redes sociais e conteúdos praticamente plastificados. Com cada vez mais posts, mais influenciadores, mais usuários, mais redes sociais para conhecer, fica difícil se aprofundar direito em qualquer coisa. A sensação de que estamos ficando para trás é sufocante e só quem tem ansiedade sabe o que é ter uma crise por acreditar que, no ritmo que o mundo está girando, nunca seremos capazes de ler, assistir, consumir e experimentar tudo o que queremos.

O slow content seria justamente um modo de criar conteúdo priorizando a qualidade e não a quantidade. Não necessariamente significa produzir menos, mas pensar com mais cuidado o que, muitas vezes, acaba fazendo com que sejamos obrigados a diminuir o ritmo. Afinal, eu particularmente não consigo manter uma frequência de um post por dia no feed do Instagram se quiser escrever um conteúdo rico, como esse, aqui no blog.

Em setembro de 2020, a VisualCapitalist publicou um estudo mostrando quanta coisa acontece na internet a cada minuto do dia. Só para se ter uma noção, lá em 2020, a cada minuto eram postados 347.222 stories no Instagram, 41.666.667 mensagens eram enviadas no Instagram, 500 horas de vídeo eram postadas no YouTube. Dá para entender a necessidade de desacelerar um pouco, né?

Segundo a Rock Content, "o slow content faz um alerta para dois problemas graves da atualidade: os usuários, que estão viciados em informações curtas e rápidas, e os produtores de conteúdo, que “alimentam” esse vício oferecendo conteúdos cada vez mais numerosos e superficiais".

UM RETORNO?

Os blogs são cantinhos totalmente personalizáveis, que não são submetidos a algoritmos e redes sociais cujo único objetivo parece ser desbancar uma à outra. Os blogs muitas vezes servem como um diário que resiste à mão do tempo e, pelo visto, vêm envelhecendo muito bem. Falo por experiência, trabalho com a criação de conteúdo em diversas plataformas e o blog, mesmo sendo atualizado menos, continua sendo a principal plataforma em visualizações e tráfego entre todas as outras que tenho.

Sou apaixonada por fotos e tomei gosto pelos vídeos quando fui forçada a mostrar a cara com um canal no YouTube, mas confesso que a melhor sensação ainda é colocar um ponto final em um texto escrito com muito carinho. É como se eu tivesse deixado um pedacinho de mim ali, e na verdade é mesmo. E o coração fica quentinho quando vejo que muita gente se identifica com essa forma de se expressar e acaba conhecendo parte do meu trabalho assim.

As newsletters, ao meu ver, trazem uma sensação semelhante de fuga ao imediatismo das redes sociais, pessoalidade, curadoria e pertencimento a algo que você escolheu ler porque quis, não porque apareceu no seu feed por alguma força maior do capitalismo. Talvez por isso mesmo estejamos vendo um boom das newsletters. E olha que elas, assim como os blogs, nos remontam a tempos mais longínquos da internet, quando o email era o que nos fazia manter contato no mundo digital. Tanto as newsletter quanto os blogs parecem trazer uma sensação mais real a respeito das experiências e vivências dos outros.

Sempre terá uma nova rede social que se tornará um fenômeno, mas que tem grande potencial de se tornar apenas passageira. Mas em um mundo em que tudo é tão efêmero e as tendências se tornam antiquadas com o passar das semanas, ver que os blogs resistem desde a virada do milênio e continuam se reinventando, diz muita coisa.

Mais pessoas estão de voltando para os blogs e, talvez por serem tão personalizáveis e mutáveis, eles continuem sempre aí, nos lembrando de temos em que a internet era mais simples, mas mais aconchegante. O Nostalgia Cinza, desta blogueira que vos fala, continua aí, desde 2013 e contando, e não vai embora tão cedo. Se você já é velho de casa, já sabe onde fica tudo, se acomode. Se está chegando agora, puxa a cadeira e vem conhecer melhor. Tenho a sensação de que muita gente vai chegar por aqui em 2022. Quem sabe não chega pra ficar também? 😉

Escrevo textos como esse que você leu durante lives de foco e produtividade, algo que cresceu bastante durante a pandemia. Quer focar comigo? Me acompanhe lá na Twitch

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2 comments

  1. Esse texto me trouxe esperanças. Obrigada!

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  2. Chegando aqui em 2023. Seu texto pontua muito bem sobre a mesma sensação que tenho sobre a internet - saudades de tempos mais simples, onde a essência era o conteúdo, a qualidade, não o tempo, o consumo, a venda.

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