Resenha: Radioativos
A história não costuma ser gentil com as mulheres, mesmo aquelas que deixaram um legado inquestionável. Marie Curie é uma delas. Sua vida também não foi tão gentil com uma mulher que perdeu o amor de sua vida, teve seu trabalho questionado, foi alvo da mídia e ainda precisou ver as consequências trágicas de um trabalho fantástico.
Radioativos nos conta parte dessa história e faz o que os quadrinhos fazem de melhor: com uma narrativa extremamente visual, nos suga para a vida de uma mulher que a história nunca permitiu que esquecêssemos. E nem deveríamos.
"Radioativos conta a história de Marie Curie, a física polonesa radicada na França famosa por seu trabalho com a radioatividade ― e a primeira pessoa a ganhar o Nobel duas vezes. O livro mostra sua infância, sua história de amor e colaboração científica com o marido Pierre, e a maneira como suas descobertas, que incluíam o rádio e o polônio, os envenenaram em câmera lenta.
Para as ilustrações, a autora usou um processo chamado impressão cianotipada, em que um desenho, através de um processo químico que envolve luz solar, se transforma numa espécie de negativo brilhante do original. E a partir de entrevistas com cientistas, engenheiros, sobreviventes de bombas atômicas e a neta de Marie e Pierre Curie, Redniss recriou com fidelidade a atmosfera e os embates científicos da Paris fin de siècle. Com um texto extraordinário e ilustrações deslumbrantes, Radioativos é uma narrativa vibrante, uma história de amor cheia de emoção e, sobretudo, uma obra de arte perfeita."
Marie Curie segue como uma das mulheres mais importantes e notórias da história da ciência. Foi a primeira mulher na França a receber o título de doutora, a primeira pessoa a receber dois prêmios Nobel, a primeira mulher a ganhar o mesmo prêmio, foi a primeira mulher a se tornar professora na Universidade de Paris e a primeira mulher a ser sepultada por seus méritos no Panteão de Paris. Em relação à forma como ela é descrita dentro da relação com Perie, a autora diz: “ele encontrou uma mulher que não impediria suas ambições científicas, mas serviria como colaboradora, musa e guia.”
A história de amor de Marie e Pierre Curie se tornou quase tão conhecida quanto o legado que deixaram na ciência. Radioativos começa com as páginas em preto e branco, traços minimalistas e quase grosseiros, com linhas de texto ocupando grande parte das páginas para contar, separadamente, a história de Marie e Pierre Curie. À medida que as vidas dos dois se entrelaçam, as páginas ganham cores e são preenchidas às vezes mais por ilustrações e desenhos do que pelo próprio texto. As cores também contam uma história paralela em Radioativos e parecem realmente vibrar nas páginas do livro.
Dividido entre a narração em terceira pessoa e trechos de diários do casal, a história é conduzida de uma forma diferente e extremamente envolvente. É difícil tirar os olhos da página de Radioativos. O quadrinho é um verdadeiro deleite para o leitor.
O storytelling usado por Lauren Redniss é impecável. Se Leonardo da Vinci acreditava na unidade da natureza e que o micro espelha o macro e vice-versa, Radioativos faz uso de um pensamento semelhante para contar a história do casal. Enquanto a história do casal, com foco em Marie Curie é contada de forma cronológica, temos inserções da contribuição futura de seu trabalho - mesmo que não positiva -, como a influência de suas descobertas no desenvolvimento da bomba atômica por Oppenheimer, por exemplo.
Radioativos é um livro que, mais do que contar a história de um casal de célebres cientistas, fala sobre heranças, sejam elas boas ou ruins. Para falar sobre radioatividade e esse capítulo na história é preciso honrar a memória daqueles que foram lesados pelo uso indevido de uma descoberta científica que foi, também, usada como arma. Mesclando desenhos e fotografias, Radioativos fala, como nenhuma outra publicação até então, da descoberta do rádio e do polônio, da vida de dois seres humanos únicos, dos sobreviventes de bombas atômicas e da herança familiar deixada por Marie e Pierre Curie.
Um dos melhores quadrinhos do ano, Radioativos é uma verdadeira obra de arte que merece um destaque único.
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