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9 de ago. de 2019

Resenha: Ponti


Ponti é um livro que vem dividindo opiniões. O sétimo livro enviado pelo Intrínsecos, agora chega às livrarias com uma capa incrível e uma premissa bem atraente. Uma história narrada por três pontos de vista, três mulheres, três histórias, três momentos distintos.

Quer saber mais sobre o livro considerado como "incrível" por Ian McEwan? Então confira a resenha de Ponti!


"Cingapura, 2003. Sem amigos e abandonada pelo pai, a adolescente Szu vive à sombra da mãe, Amisa, uma ex-atriz que ganha a vida ao lado da irmã como médium, em uma casa caindo aos pedaços. Quando Szu conhece Circe, uma menina privilegiada e sarcástica, as duas constroem uma amizade intensa, um alívio para o ambiente tóxico controlado por Amisa e a inadequação que Szu sente no colégio. Mas não demora muito para que Circe fique fascinada pela intocável ex-atriz e as três estabeleçam uma dinâmica que as marcará para sempre.

Dezessete anos depois, Circe está lidando com os desdobramentos de um divórcio complicado, quando um projeto novo surge no trabalho: a refilmagem do filme cult de terror dos anos 1970 Ponti!, a obra que definiu a curta carreira de Amisa. De uma hora para outra, Circe perde o chão e mergulha nas memórias das mulheres que ela conheceu, na culpa e em um passado que ameaça sua consciência tranquila.

Contado pela perspectiva das três mulheres em momentos distintos de suas vidas, Ponti, livro considerado “Incrível” por Ian McEwan, é uma história original sobre amizade e memória no breve espaço de algumas décadas. Um retrato generoso da avassaladora solidão da adolescência e um vislumbre de como pequenas e grandes tragédias podem nos tornar monstros."

FICHA TÉCNICA
Título: Ponti
Autora: Sharlene Teo
Ano: 2019
Páginas: 272
Idioma: Português
Editora: Intrínseca
Nota: 3,5/5 
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LIVRO CEDIDO EM PARCERIA COM A EDITORA



O pontianak é um fantasma muito conhecido na mitologia malaia e seria uma figura assustadora do espírito de uma mulher que morre durante o parto. Segundo a própria autora, o mito malaio descreve o Pontianak como um ser mitolófico, canibal e belo, criado quando garotas fazem um trato com um shaman para se tornarem belas. Com a pele translúcida e os longos cabelos pretos, esse fantasma seria uma forma de assustar maridos e impedí-los de buscar outras garotas bonitas.


Em Ponti, a figura do pontianak aparece como o ponto de encontro das três protagonistas: Szu, Circe e Amisa. Amisa, quando mais nova, representou o papel de um pontianak em um filme cult de terror. Szu, sua filha, tem uma forte conexão com o filme porque é uma das formas que ela encontra de se conectar com a mãe e de tentar entendê-la. Circe, quando adulta, se depara com a tarefa de trabalhar na divulgação de um remake do filme que a leva de volta para o tempo em que ainda era amiga de Szu.

O livro é narrado por três mulheres em tempos diferentes. Szu apresenta os acontecimentos de 2003, Circe narra a história a partir de 2020, e Amisa leva o leitor de volta ao século passado.

"Nunca conheci ninguém como Amisa Tan. Ela tinha um estilo próprio de indiferença ofensiva e ao mesmo tempo atraente que eu queria desenvolver um dia." Página 82




A ambientação é um dos pontos mais altos do livro. Estamos tão acostumados a ler livros escritos por autores norte-americanos e europeus, que encontrar uma ficção ambientada na Ásia e em um país tão exótico quanto a Cingapura é realmente um alívio. Esse foi o fato que me deixou mais curiosa a respeito do livro e a autora não decepciona nesse sentido. Apesar de não aprofundar na descrição dos cenários e não focar no ambiente onde se passa a história porque, afinal, o propósito do livro não é esse, o leitor pode ter um contato breve com uma cultura diferente, o que enriquece o livro.

Além disso, Sharlene Teo consegue expressar bem as aflições e emoções de suas protagonistas, dando uma camada a mais para o livro. Gosto quando sentimentos são explorados de diferentes formas na ficção e foi interessante poder sentir um pouco do que Amisa, Szu e Circe guardavam ao longo da leitura.

Entretanto, foi difícil entender o propósito do livro como um todo. A princípio pensei que se tratava de uma história sobre redenção, em que a junção de personalidades causaria algum tipo de conflito até que o desenvolvimento das personagens as levariam a uma trégua. Em seguida acreditei que o foco do livro seriam conflitos familiares, uma vez que a história se baseia, em grande parte, nas consequências das atitudes de Amisa para com Szu. Cheguei a considerar que a lição do livro seria a respeito da consequência de nossas ações para com os outros e até mesmo sobre relacionamentos tóxicos. Por fim, uma das mensagens que fica, para mim, é a solidão de três mulheres que não conseguem se perdoar nem seguir em frente.


Ponti está dividindo os leitores, com algumas impressões bem negativas a respeito da história. Apesar de não ter ficado com uma impressão tão ruim, o fato é que o livro deixa a desejar. Ponti é um livro muito curto para a complexidade que a autora prometia. Liane Moriarty, por exemplo, é uma autora à qual sempre faço referência no que diz respeito à construção de personagens. Ela consegue, de forma primorosa, trabalhar três protagonistas completamente distintas, mesclando suas histórias em um enredo inteligente, sem deixar pontas soltas. É visível que Sharlene Teo tenta fazer algo semelhante, trazendo três vivências diferentes e brincando com a questão da cronologia dos acontecimentos. Entretanto, ela não aprofunda em nenhuma das questões que levanta e termina o livro bem quando parece que a narrativa engata.

A narrativa de Szu e Circe é feito em primeira pessoa, mas a de Amisa é contada em terceira pessoa e achei um fato curioso e adoraria entender melhor essa escolha. Não posso afirmar se foi algo intencional, mas me deixou refletindo se seria uma forma de mostrar que Amisa é alguém inacessível até mesmo para o leitor do livro.

"O luto transforma as pessoas em fantasmas. Não me refiro apenas às que se vão, mas às que ficam. Depois de um tempo, minha tia faz um carinho na minha mão e se levanta." Página 137


Em entrevista ao The Guardian, Sharlene Teo fala sobre um aspecto central de Ponti: a rivalidade entre duas adolescentes. Em seu livro de estreia, ela oferece uma alternativa aos enredos convencionais das histórias de high-school americanas. São duas protagonistas pouco atraentes, com bagagens pessoais e que criam uma certa dependência em relação a outra de um jeito pouco construtivo. A verdade é que Ponti é um livro bem humano, com protagonistas extremamente falhas, com defeitos e cicatrizes profundas, cada uma à sua maneira.

A escrita do livro é boa e é possível perceber um potencial em Sharlene Teo. Ponti é seu primeiro livro, mas a autora se mostra um nome promissor. A leitura do livro é fácil e ela sabe brincar com a narrativa, sua história tem movimento. Entretanto, por melhor que tenha sido a escrita e a ambientação, o livro peca em subestimar o leitor e não entregar um desenvolvimento mais pensado e melhor estruturado.


Ponti é um livro capaz de gerar reflexões, principalmente no que diz respeito à maneira com a qual deixamos nosso passado moldar quem somos e definir o nosso futuro, mas poderia ser muito mais. Existe uma quebra de expectativa que, infelizmente, afeta a leitura como um todo.

Continuo muito curiosa para conferir os próximos trabalhos de Sharlene Teo, ela é uma autora bem promissora que já estreou no mercado editorial deixando uma marca bem forte. Ponti é um bom começo para uma autora estreante e, mesmo podendo ser melhor, foi uma leitura que me agradou.

Gostou da resenha e quer mais uma indicação de ficção? Então confira a história de Um Lugar Bem Longe Daqui!

"Durante a adolescência, tudo o que a gente sabe é tudo o que a gente sabe, o que não deve ser ignorado. Temos uma visão estreita do mundo, e os riscos são menores, mas sentidos com a mesma profundidade. O céu adolescente eram o piso de mármore das lojas e letreiros laterais de neon, atrás de blaustradas de vidro. Um mundo perfumado e seguro." Página 84


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