E enquanto encarava aquele espaço tentando encontrar uma solução, percebi que havia muito mais ali do que livros. Sempre acreditei que aquilo que escolhemos guardar mostra um pouco das coisas às quais nos apegamos, àquilo que, inconscientemente, nem sempre compartilhamos com o mundo. Me perguntei que tipo de mensagem traria a minha estante e, em alguns segundos, me vi sugada por lembranças, anseios, desejos e reflexões.
Que tipo de imagem criariam de mim se pudessem ver apenas os livros que já li? Veriam uma Laura bem romântica? Uma mulher imaginativa? Uma feminista cada vez mais consciente? Uma pessoa indecisa e com um gosto bem eclético? Alguém que busca respostas? Uma yogi dedicada aos estudos?
E foi quando percebi que minha estante falava mais de quem eu era do que, talvez, eu mesma poderia explicar.
Vários espaços guardavam todos os romances que eu já li, aquecendo meu coração e me levando para um tempo em que histórias de amor eram tudo o que dava sentido para noites solitárias na minha própria companhia. Um nicho todo reservado para a minha saga preferida me mostrou como, por mais que eu tenha mudado, ainda carrego comigo as lembranças e os segredos de uma mulher que sempre buscou respostas em si mesma. Outro cantinho só para meus quadrinhos continua me incentivando a sair de mim e me aventurar em mundos alheios. Um espaço para todos os livros de jornalismo me levou de volta para os primeiros períodos da faculdade, quando me maravilhei com indicações de leitura e saídas da minha zona de conforto, naquele que seria um caminho inteiramente novo. Vários outros nichos guardavam histórias que me ajudaram a passar pelos mais diversos momentos, que me ensinaram mais do que eu era capaz de absorver, que me inspiraram a sair do lugar, que me moldaram de formas indescritíveis e irreparáveis. E até mesmo alguns livros para doação se empilhavam atrás de algumas caixas, revelando uma Laura que não existe mais, mas que já esteve ali. Percebi que, por muito tempo, tentei separar todas as partes de mim, como se pudesse viver uma de cada vez da mesma forma que organizava os meus livros. Hoje, algum tempo e vários livros depois, preciso mesclar as leituras e colocá-las onde elas podem se encaixar melhor. E vejo como isso reflete a pessoa que me tornei, alguém que entende que pode ser tudo o que ela é, por inteiro. Não consigo mais me dividir em partes porque cada uma delas deixou sua marca em mim. Minha estante me lembra disso todo dia, eu apenas não havia reparado antes.
E cada livro está ali, exposto, querendo se mostrar, querendo ser visto e tocado, amado, sentido. E cada cantinho de mim se viu ali, acolhido. Há algum tempo eu havia entendido que ser mosaico era melhor do que ser quebra-cabeça e minha estante, sem que eu percebesse, passou a servir de espelho para quem eu havia me tornado. Acompanhando processos que eu nem percebia, conscientemente, que estava vivendo.
Enxergar a minha estante com esse olhar me fez perceber que existem mais formas de olhar para mim também. E é tão gostoso quando a gente descobre novas maneiras de se apaixonar por si mesma. Naquele momento eu amei um pouco mais a minha estante e, fazendo isso, me amei um pouco mais também.
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