Resenha: Uma vida no escuro
Acho que uma das melhores sensações para um leitor é
quando uma história te surpreende de um jeito absolutamente incrível. Uma vida
no escuro me encantou pela capa e pelo mistério que envolvia a história. Quando
peguei o livro pela primeira vez não fazia ideia do tesouro que tinha em mãos.
“Com uma carreira consolidada e um
apartamento recém-comprado em Londres, parecia que a única preocupação de Anna
Lyndsey seria a manutenção de seu padrão de vida. No entanto, o que começou
como um desconforto diante da tela do computador revelou-se uma grave
sensibilidade a qualquer fonte de luz. Em pouco tempo, trabalhar tornou-se
inviável, e mesmo atividades corriqueiras passaram a causar dores lancinantes.
Conforme os sintomas foram se agravando, ela precisou abrir mão da casa, da
independência e de qualquer possibilidade de planos futuros.
Diante do relato de Anna sobre seus
dias na escuridão, é impossível para o leitor não se perguntar o que de fato é
fundamental. Se quase todas as opções fossem retiradas, das mais corriqueiras
às mais preciosas, o que faria a vida continuar valendo a pena? Em uma situação
em que as luzes e telas que deveriam significar segurança e comodidade são um
perigo iminente, não seria de se admirar que Anna entrasse em depressão ou até
mesmo cometesse suicídio.
No entanto, ela nos revela uma
existência com mais nuances do que se poderia esperar de alguém mergulhado no
mais profundo breu. Entre audiolivros, jogos de palavras e formas inusitadas de
banir os raios de luz, Anna descobre meios de afastar os pensamentos
deprimentes e perseverar mesmo com a incerteza de sua condição. Com seu contato
com o mundo externo restrito à família, ao marido e às raras visitas, ela
aprende a valorizar cada segundo de remissão da sua sensibilidade, admirando a
natureza, a rotina e até as tarefas domésticas de uma perspectiva completamente
nova.”
Uma vida no escuro
conta a história real de uma britânica, que escreve através do pseudônimo Anna
Lindsay, que descobre, depois de adulta, que possui uma raríssima doença. Anna
tem uma extrema sensibilidade à luz, qualquer contato com a luminosidade, seja
do sol ou artificial, lhe causa uma dor excruciante; "como se apontasse um
maçarico para o meu rosto". No começo ela sente apenas um forte
desconforto e intolerância, mas com o passar dos meses a doença se manifesta de
tal forma que ela precisa largar seu emprego e sua vida para se refugiar no
escuro. Ela, forçada por sua condição, começa uma nova vida longe de tudo que
conhecia.
Geralmente
evito ler livros que abordem uma temática realista a esse ponto e que contem
histórias de pacientes, nunca tive a cabeça mais tranquila do mundo para lidar
com esses assuntos e sei que muitas pessoas são assim também. Mas Uma vida no
escuro é um livro simplesmente sensacional, diferente de tudo que eu já li e
vou contar um pouquinho do por que acho esse livro uma preciosidade.
Anna
Lyndsey escreve com uma sensibilidade descomunal. A princípio, não fica claro
qual doença ou qual problema aflige a escritora. Ela vai contando detalhes e
fazendo insinuações. Deixa o leitor entender sua doença sem jogar a verdade
logo de cara, como se quisesse que nós entendêssemos o que ela mesma sentiu,
primeiro desconfiança e confusão, para só depois perceber do que se trata toda
aquela dor. Anna nos conduz por uma viagem no tempo de sua vida anterior, como
ela mesma faz questão de separar ao longo de toda a narrativa, contando em
detalhes todas as implicações principalmente psicológicas que ela passou a lidar.
Uma
vida no escuro é um livro simples e extremamente bem escrito e pensado. O livro
é dividido em duas partes principais, sendo a Parte Um um primeiro contato com
sua pessoa, a doença e sua nova forma de ver e viver o mundo. É quando o medo
de Anna se mostra mais aparente e intenso. A Parte Dois é um pouco mais
otimista por conta de melhoras inconstantes na sua condição e é um pouco menor
em comparação à primeira. Além das partes principais, vários capítulos compõem
sua história. Alguns capítulos são intitulados sonhos e numerados de acordo com
a ordem de ocorrência, e Anna conta algumas das histórias que se formam em sua
cabeça enquanto ela dorme. Outros são memórias de sua vida anterior
intercalados com capítulos que contam, de forma cronológica, sua rotina. Alguns
trechos de cartas e conversas com médicos também ocupam as páginas do livro. Anna
também compartilha em alguns capítulos, jogos que ela mesma criou ou adaptou
para poder se entreter durante seus longos períodos de reclusão forçada,
podendo ser jogados apenas por ela ou por suas ocasionais visitas.
Ao
longo da narrativa Anna descreve como se sentia impotente diante da falta de
informação que os médicos dispunham e os poucos relatos de pessoas com a mesma
condição que ela. Difícil explicar o que nem quem deveria entender sobre
consegue compreender.
Anna
tem uma sensibilidade em notar os pequenos detalhes e transformar as nuances da
vida em poesia, é uma escritora nata. O livro é simplesmente maravilhoso no
sentido de dar um choque de realidade para as pequenas situações que, para nós,
parecem absolutamente banais. Ao ser privada de viver sua vida como uma pessoa
normal, Anna transforma as mínimas ocorrências em coisas mágicas e
apaixonantes. Seu relato sobre a primeira vez que pôde se aventurar pelo seu
jardim após um longo período na escuridão é de tirar o fôlego, encher os olhos
de lágrimas e apertar o coração com um calor inexplicável.
Uma vida no escuro é
um livro essencial para todos que tem uma sensibilidade maior para com a vida.
A escrita de Anna é incrível, seu modo de ver e pensar a vida é apaixonante e
sua história é comovente e intrigante. Uma vida no escuro entrou para a minha
lista de favoritos não só do ano, mas da minha estante e tenho certeza que é
uma dessas leituras infalíveis. Perfeito.
Uma vida no escuro foi escrito por Anna Lindsay e publicado pela editora Intrínseca.
Classificação: 5/5
estrelas.
“É muito
difícil deixar um quarto totalmente escuro.
Primeiro,
forro as cortinas com um material corta-luz, um tecido grosso que parece
plástico e que tem um tom estranho de bege. Mas a luz se infiltra sem a menor
dificuldade: por cima, passa pelo espaço entre o trilho e a parede; embaixo,
pelas ondulações das dobras do tecido.
Então
acrescento uma persiana de enrolar, também corta-luz, por dentro da moldura da
janela. Mesmo assim, a luz escapa pelas laterais e passa, tremulante, pela
fenda no topo.
Decido atacar as vidraças. Recorto folhas de papel-alumínio e
pressiono-as nos vidros, colando-as com fita adesiva na moldura da janela. Mas
o papel-alumínio enruga e rasga, recusando-se a se manter liso. Ainda há
frestas nos cantos, além de furos e rasgos no meio. Passo ainda mais fita
adesiva, grudando um pedaço de fita por cima do outro e sobrepondo mais folhas
de papel alumínio, formando camadas e mais camadas. Em vez de folhas lisas emendadas
com pedaços únicos de fita, a coisa está virando uma instalação de arte fora do
controle. Mas não posso parar. A luz está rindo de mim, está me provocando,
escondendo-se e me fazendo pensar que consegui completar uma área para, assim
que avanço para o próximo pedaço, se esgueirar por algum buraquinho que passou
despercebido. O dia lá fora é um oceano pulsando pressionando méis muros de contenção,
e preciso vedar um dique que vaza constantemente, enfrentando o seu poderio.
Por fim, considero que terminei. Abaixo a persiana sobre a colha
de retalhos Doda que fiz com papel-alumínio, fecho as cortinas e ponho uma
toalha enrolada na fresta inferior da porta. Sento-me na cama cuidadosamente e
espero meus olhos se adaptarem.
E consigo. Finalmente consigo. Está escuro.
Deito-me em minha caixa escura, o novo receptáculo de minha
vida. Sou tomada de cansaço e alívio.”
Gostou da
resenha? Já leu o livro ou ficou com vontade de ler? Então não esqueça de
deixar uma curtida ou um comentário ;)
10 comments
Já escutei sobre esse livro e lendo essa resenha só me deu mais vontade de ler. Parabéns a sua escrita é excelente <3
ResponderExcluirMuito obrigada!! Espero que leia mesmo, tenho certeza que vai amar <3
ExcluirNossa amei, vou comprar com certeza.
ResponderExcluirMe conta depois o que achou <3
ExcluirNossa que livro interessante, transformador amo livros assim!
ResponderExcluirwww.pegaobrilho.logspot.com
Sério, é um dos livros mais interessantes que li nos últimos tempos. Vale muito a pena <3
ExcluirOi Laura!
ResponderExcluirVim voando de um daqueles grupos do face, pois além de colocar meu link, gosto de visitar os que lá colocam também.
Sou viciada em livros, mas acho que leituras são como filmes: uma hora queremos ler um estilo aventura, outra hora biografia... Particularmente, curto biografias e fiquei interessada em ver a "reviravolta" que a autora dá diante de tal situação - uma mudança tão brusca de vida.
Mais um que vai pra minha infindável listinha de desejados do Skoob.
Abração esmagador.
Márcia.
Oi, Márcia! Obrigada por ter passado aqui, agradeço pela visita. É exatamente assim que me sinto em relação a livros, e acho que o propósito é justamente esse, né? Dê uma chance a esse livro, tenho certeza que vai se apaixonar <3
ExcluirUou, ta aí um livro que eu gostei para ler.
ResponderExcluirObrigada pela dica.
adorei o post.
beijos
http://vempracaamiga.blogspot.com.br/
De nada, espero que goste <3
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