Sobre o eterno “e se” e quase lembranças.
Ela estava
sentada numa cadeira alta de bar feliz por ter escolhido seus coturnos ao invés
de um salto alto. Ela adorava aquele lugar; ótima comida e rock estourando nas
caixas de som, do jeito que ela gostava.
Enquanto
ela ouvia as conversas banais de seus amigos, sentiu sua presença. Foi algo
fraco, quase insignificante, mas fez com que sua cabeça virasse em sua direção.
Não conseguiu ver o resto do homem direito e logo se esqueceu de sua presença.
À
medida que o show começava, ela foi com seus amigos até perto do palco, e assim
que passou pelas mesas de bilhar, aquela presença fez com que sua cabeça
virasse de novo. Lá estava ele, quase solitário, dedicando sua atenção à mesa à
sua frente. Agora ela podia vê-lo claramente.
Ela
era um homem de verdade, ela pensou, macho. Usava calças jeans escuras e uma
camisa azul escura de mangas compridas. Todos os seus músculos estavam visíveis
na medida certa. Ele segurava o taco de bilhar deixando seus bíceps à mostra. A
maneira como ele pegou uma garrafa de cerveja e tomou um gole foi como um
afrodisíaco para ela. Ele tinha uma barba mal feita que fez com que ela
pensasse em todos os lugares perfeitos para raspá-la contra sua pele. Seu
cabelo era comprido, o que normalmente não faria o tipo dela, mas não
importava. Naquele momento, ele a atraía de uma maneira inexplicável, em todos
os sentidos.
A
partir daquele momento, ela praticamente não conseguiu tirar os olhos dele.
Durante o show, ela o procurava com o olhar, precisava olhar para ele por
alguns instantes antes de deixar sua atenção voltar para a música que vinha do
palco. Queria ter a certeza de que aquelas feições másculas ainda estavam
focadas no jogo ou na banda que tocava. Queria ver onde seus olhos estavam se
focando, se estavam claros naquela luz.
Por
quase duas horas ela o observou indo para a frente do palco quando alguma
música que ele gostava estava tocando e depois voltando para seu jogo. Ela
podia ver seus lábios se moverem para acompanhar a letra das músicas. Ele sabia
todas, por sinal. Por nenhum momento seus olhos se cruzaram, a atração
permanecia sempre platônica.
Quando
o show terminou, ela não o encontrou. Puxou sua amiga pelo braço insistindo em
dar uma volta no lugar. Em vão; ele não estava em lugar nenhum, não estava à
vista.
Sentindo-se
frustrada, juntou-se aos seus amigos na fila do caixa. Algum tempo depois, ela
viu com o canto do olho quando ele saiu do banheiro. Ele caminhou até onde ela
estava ainda sem cruzar com seu olhar. De um instante para o outro, isso mudou.
Ele
olhou para ela e foi como se faíscas começassem a surgir entre os dois. A
tensão no ar era praticamente palpável. A troca de olhares foi tão intensa que
ela chegou a pensar que era impossível que ele não estivesse sentindo aquilo
também. Mesmo enquanto andava, ele sustentou seu olhar até o fim. Ela podia
quase sentir o cheiro da testosterona exalando dos poros dele. Apenas quando
ele se virou ela conseguiu respirar normalmente de novo. Jurou que seu coração abriria um buraco em seu peito.
Esperou
alguns minutos e pôde vê-lo falando com um amigo enquanto sorria e apontava em
sua direção. Sentiu seu corpo inteiro se aquecendo de expectativa.
Sentiu
seu olhar sobre ela e não pôde deixar de sorrir. Pagou sua consumação no caixa
e quando se virou para procurá-lo, ele já não estava mais lá. Procurou com os
olhos, mas não conseguiu encontrá-lo. Seus amigos a chamaram e, após olhar uma
última vez para o interior do pub, seguiu frustrada o pequeno grupo.
Quando estava chegando
à escada que conduzia para a saída, sentiu uma mão grande e forte segurando seu
braço. Virou-se prestes a empurrar o imbecil quando seu olhar encontrou o dele.
Por um instante ela se
esqueceu de como respirar. Os olhos dele estavam negros naquela luz e ela
sentiu arrepios tomando conta de sua pele. Ele entrelaçou suas mãos e a puxou
para dentro do pub novamente. Foi até um canto e a prendeu entre a parede e seu
corpo másculo.
Ela queria sorrir
porque era assim que se sentia, mas o calor do corpo dele era embriagante
demais. Ele tinha cheiro de carvalho, cravo e homem.
Ele segurou sua
cintura apertando de uma maneira deliciosa e bruta. Não foi ele quem tomou a
iniciativa, mas colocou uma mão em sua nuca puxando-a um pouco para si. Foi ela
quem passou os braços ao redor do pescoço dele e se inclinou selando seus
lábios.
Ela agradeceu
mentalmente por ter os braços dele e a parede para sustentá-la porque não
confiava mais em suas pernas. Quando ele colou seu corpo no dela, ela gemeu e
pôde sentir o sorriso dele em seus lábios. Seus ombros eram largos e seu
peitoral era forte, aconchegante.
Ela pôde sentir o
gosto de cerveja em sua língua e se lembrou dele jogando bilhar. Ele se afastou
apenas o suficiente para que ambos pudessem respirar por um instante. Deixando seu lado bruto
de lado, ele brincou um pouco com o cabelo dela e riu. Sua risada rouca fez a
pele dela arrepiar. Ao mesmo tempo em que ele era bruto, ele sabia ser gentil.
Era um contraste novo e incrível.
Ela encostou a testa
na dele quando ele puxou-a para si novamente. Quando seus lábios se encontraram
de novo e seus corpos se colaram numa fome de calor, ela pensou em como aquilo
era fantástico, em como aquele belo estranho era incrível contra seu corpo e
como aquilo ainda podia melhorar muito mais.
Suas mãos firmes percorriam
as coxas dela e subiam até a curva de seus seios. Ela já não se contentava mais
em apenas sentir suas costas quentes e musculosas por baixo da camisa. Agora
ela colava suas mãos no peito dele do mesmo modo que a camisa azul havia feito
pouco antes.
Naquele momento, não
estavam no meio de uma multidão, se agarrando contra a parede de um pub de rock
qualquer.
Quando se afastavam
pelo mínimo de tempo possível, sentia o peitoral dele encostando nela à medida
que ele ofegava. Quando a boca
dele tomava a sua e sua língua explorava a boca dela possessivamente, ela podia
jurar que derreteria ali mesmo. E quando a boca dele desceu até o seu pescoço,
sorriu pensando em onde aquilo iria parar.
Ela sentiu quando ele
apertou seu quadril, sentiu quando ele puxou seu cabelo e quando ele a empurrou
ainda mais contra a parede. Ela sentiu tudo. E não estava perto de ser o
suficiente.
Olhando mais uma
vez ao redor do pub e ouvindo as batidas pesadas da música, ela colocou a
jaqueta e desceu as escadas até a porta de saída. O vento gelado a atingiu
assim que ela colocou os pés na rua. Cruzou os braços abraçando a si mesma
tentando se aquecer pelo menos um pouco. A realidade foi como um punho de ferro
gélido.
Ela
olhou para a porta do pub mais uma vez, observando as luzes piscando e os
vultos que circulavam lá dentro. Uma corrente de ar jogou alguns fios de cabelo
em seu rosto e ela nem se incomodou com aquilo. Esperou alguém sair por aquela
porta. Alguém.
–
Ei! – Uma amiga a chamou quando o táxi parou na rua.
Olhando
uma última vez por cima do ombro, ela sentiu seu coração, antes acelerado e
inquieto, se acalmando e, pesadamente, voltando ao seu batimento regular. Agora
o frio da noite percorria e tomava conta de todo seu corpo, inclusive de seu
coração.
Fechou
o zíper de sua jaqueta e com um suspiro obrigou seus pés a caminharem até o
táxi que a aguardava. Sem olhar mais nenhuma vez para a entrada do pub, ela
entrou no carro e se lembrou das feições másculas do homem.
À
medida que o carro dava partida e se distanciava do lugar, ela olhou pela
janela e pensou em como às vezes o famoso “e se” pode ser delicioso e amargo. Sabia que não iria se esquecer daquele rosto por um bom
tempo, por mais que tentasse.
Vez ou outra
ela encontrava alguém diferente, alguém que capturasse seu olhar por mais de alguns
segundos. Alguém com um caminhar diferente, com um olhar mais intenso, com um
jeito mais profundo. De vez em quando ela encontrava um ou outro capaz de
esquentar seu coração frio e revirar seu estômago sempre tranquilo.
Constantemente ela levava consigo memórias daquilo que poderia ter sido e não
foi.
Por mais que
ela se revoltasse, se indignasse e se chateasse, algumas coisas não acontecem,
algumas lembranças não se formam e o jeito é aceitar que aquilo que está simplesmente fora
de seu alcance. Ela teria que sorrir e guardar consigo uma quase lembrança e
torcer para não demorar a encontrar um novo belo estranho numa noite qualquer.
Ah, Laura, sua escrita. <3 Adorei a forma como o "e se" foi abordado, sério. Deixou mais nítido até onde podemos ir só com a expectativa de algo acontecer. Parabéns pelo texto e esse seu dom maravilhoso.
ResponderExcluirternatormenta.blogspot.com
Amo quando você comenta aqui, Nanda! Muito obrigada por esse comentário, fico feliz que você tenha gostado, de verdade <3
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